Introdução
Você já cuidou de um paciente com insuficiência renal que não parava de se coçar, mesmo sem sinais visíveis na pele? Esse incômodo pode ser o prurido urêmico, um dos sintomas mais comuns — e mais desconfortáveis — em pessoas que fazem hemodiálise.
Embora muitas vezes seja ignorado ou subestimado, o prurido pode afetar diretamente o sono, o humor, a alimentação e até a adesão ao tratamento. E é aí que entra a atuação fundamental do enfermeiro. Saber identificar, acolher e aplicar cuidados específicos faz toda a diferença na qualidade de vida do paciente.
Neste artigo, vamos entender o que é o prurido urêmico, por que ele acontece, e como a enfermagem nefrológica pode agir para trazer alívio e conforto. Tudo com uma linguagem clara, direta e prática para você aplicar no seu dia a dia.
O que é Prurido Urêmico e por que ele acontece?
Você sabia que uma simples coceira pode indicar algo muito mais sério em pacientes com doença renal crônica? O prurido urêmico é uma condição comum, mas muitas vezes subestimada, que afeta significativamente a qualidade de vida de quem vive com insuficiência renal. Especialmente em estágios avançados da doença e entre pacientes em hemodiálise, essa coceira persistente pode se tornar um verdadeiro desafio para o bem-estar (Mettang & Kremer, 2022).
O prurido urêmico é caracterizado por uma coceira crônica que não está associada a outras doenças dermatológicas e que afeta, segundo estudos recentes, entre 40% e 50% dos pacientes em hemodiálise. As causas ainda não são completamente compreendidas, mas pesquisas científicas apontam para uma série de fatores que, em conjunto, contribuem para o surgimento desse sintoma incômodo (Mettang & Kremer, 2022).
Entre as possíveis causas estão o acúmulo de toxinas urêmicas no organismo — substâncias que normalmente seriam eliminadas pelos rins saudáveis — e os desequilíbrios nos níveis de cálcio e fósforo no sangue, algo comum na doença renal crônica. Outro fator importante é a pele ressecada, conhecida como xerose cutânea, que agrava ainda mais a sensação de coceira. Além disso, alterações nos sistemas nervoso e imunológico também podem estar envolvidas, assim como a liberação de substâncias inflamatórias como a histamina e as citocinas, que provocam e intensificam a coceira (Pisoni et al., 2022).
Apesar da prevalência elevada, muitos pacientes não recebem o tratamento adequado. A falta de reconhecimento do problema, tanto por parte dos pacientes quanto dos profissionais de saúde, contribui para um sofrimento silencioso que pode impactar negativamente o sono, o humor e a qualidade de vida (Pisoni et al., 2022).
Sinais de alerta para os profissionais de enfermagem
O prurido urêmico muitas vezes passa despercebido, mas o enfermeiro, que está diariamente em contato com o paciente renal, pode — e deve — ser o primeiro a identificar os sinais de alerta. A atenção aos detalhes e o acolhimento humanizado fazem toda a diferença para melhorar o conforto e a qualidade de vida desses pacientes (Narita et al., 2022).
Sinais como coceira intensa, principalmente à noite, são frequentes. Quando o paciente chega a apresentar feridas pelo ato de coçar, é um indicativo de que o quadro está avançado e requer intervenção. Outros sinais que devem chamar a atenção são a irritabilidade, queixas constantes de desconforto, dificuldade para dormir e queda significativa da qualidade de vida.
Muitos pacientes, especialmente os mais antigos em hemodiálise, consideram a coceira algo “normal” do tratamento, e por isso não relatam espontaneamente esse sintoma. Uma dica prática e valiosa é sempre incluir perguntas específicas sobre prurido durante o acolhimento e na anamnese de rotina. Identificar precocemente o desconforto permite um plano de cuidado mais eficaz e melhora a adesão ao tratamento (Yosipovitch & Papoiu, 2022).
Cuidados de Enfermagem: Como aliviar o desconforto?
Embora o prurido urêmico ainda não tenha cura definitiva, ele pode — e deve — ser controlado com uma abordagem multiprofissional. O enfermeiro tem um papel essencial nesse processo, contribuindo para a melhoria do conforto e do bem-estar do paciente. O primeiro passo é o cuidado com a pele. Pacientes renais costumam apresentar pele ressecada, o que intensifica a coceira. Estimule o uso diário de cremes hidratantes sem fragrância e com ureia em baixa concentração (até 10%). Um exemplo prático: muitos pacientes relatam alívio da coceira noturna após aplicar hidratante com ureia a 5% antes de dormir (Simonsen et al., 2023).
Outro aspecto importante são os cuidados com a higiene. Oriente o paciente a evitar banhos quentes e demorados, preferindo água morna, uso de sabonetes neutros e secagem delicada da pele, sem friccionar. Essas medidas simples fazem diferença significativa no controle da coceira (Simonsen et al., 2023).
Quanto ao uso de medicamentos, embora a prescrição seja médica, o enfermeiro deve monitorar atentamente a resposta do paciente. Entre as opções frequentemente utilizadas estão os anti-histamínicos (quando há liberação de histamina), gabapentina ou pregabalina (que agem no sistema nervoso central) e cremes com capsaicina, que podem reduzir a sensação de coceira em alguns casos (Weisshaar et al., 2022).
Além disso, medidas complementares podem ser incluídas no plano de cuidados: orientar o uso de roupas leves e de algodão, manter o ambiente arejado e estimular práticas que ajudam no controle da ansiedade e do estresse, como a musicoterapia, a meditação guiada ou até o uso de aromaterapia. O enfermeiro também deve acompanhar o impacto do prurido na rotina do paciente, incluindo o sono e a alimentação, e trabalhar junto à equipe para ajustar estratégias sempre que necessário (Weisshaar et al., 2022).
Educação do paciente e acolhimento: papel essencial do enfermeiro
Quando falamos em prurido urêmico e outros desconfortos vividos pelo paciente renal, não estamos lidando apenas com sintomas físicos — estamos falando também de sofrimento emocional, frustração e impactos diretos na adesão ao tratamento. E é aqui que o papel do enfermeiro faz toda a diferença (Chan et al., 2020).
Um paciente que se sente acolhido, respeitado e escutado tem mais confiança na equipe de saúde. Ele adere melhor às orientações, relata mais sintomas e participa ativamente do seu cuidado. O enfermeiro, ao se colocar como educador e guia, consegue transformar o dia a dia da diálise em algo mais leve e humano (Chan et al., 2020).
Educar com empatia é ensinar com o coração. Uma conversa breve durante a punção, um material informativo entregue com carinho ou uma escuta ativa durante uma queixa podem mudar o rumo da experiência do paciente renal (Gerogianni & Babatsikou, 2021).
Como a especialização em Nefrologia transforma o cuidado
Cuidar de um paciente renal vai muito além de ajustar uma bomba de hemodiálise ou monitorar exames laboratoriais. Requer sensibilidade, conhecimento aprofundado e um olhar atento ao que está por trás dos números e protocolos (Gerogianni & Babatsikou, 2021).
Quando o enfermeiro se especializa em Nefrologia, ele aprende a enxergar o paciente como um ser humano complexo, que convive com dor, limitações e inseguranças. A especialização permite entender as doenças renais de forma sistêmica, conhecer as complicações mais comuns, os cuidados com acesso vascular, as abordagens humanizadas e a comunicação terapêutica mais eficaz (Lopes et al., 2021).
Essa formação técnica e emocional faz com que o cuidado se torne mais inteligente, preciso e empático. Não é exagero dizer que uma pós-graduação em Nefrologia transforma vidas — a do paciente e a do profissional (Lopes et al., 2021).
Benefícios para a prática clínica:
O conhecimento adquirido por meio da educação continuada em Nefrologia reflete diretamente na prática clínica do enfermeiro. Veja alguns benefícios reais que esse aprendizado traz para o seu dia a dia:
- Capacidade de identificar precocemente sintomas invisíveis, como o prurido urêmico, antes que eles comprometam o bem-estar do paciente;
- Aumento da eficácia dos cuidados, pois o enfermeiro entende melhor o que fazer, como fazer e o porquê de cada ação;
- Comunicação mais clara com o paciente e com a equipe, promovendo um cuidado colaborativo e mais eficiente;
- Satisfação pessoal por ver o alívio e a melhora real no estado emocional e físico dos pacientes;
- Maior reconhecimento profissional e autoridade técnica dentro da equipe multiprofissional.
Tudo isso se traduz em uma prática clínica mais segura, humanizada e resolutiva — exatamente o que o paciente renal precisa e merece.
Conclusão
O prurido urêmico pode parecer, para quem vê de fora, apenas uma coceira. Mas para quem sente, é um sofrimento diário, constante e muitas vezes negligenciado. Como profissionais de enfermagem, temos uma grande responsabilidade — e também uma linda oportunidade — de fazer a diferença na vida desses pacientes.
Educar, acolher, aliviar e transformar fazem parte da nossa missão. E quanto mais conhecimento temos, mais ferramentas ganhamos para cumprir essa missão com excelência.
Se você quer ser esse profissional preparado, humano e valorizado, chegou a hora de dar o próximo passo. Conheça agora a NefroPós — a melhor pós-graduação em Enfermagem Nefrológica do Brasil. Acesse o link e transforme sua carreira e o cuidado que você oferece!
Referências
Chan EA, Wong FKY, Cheung MYE. “Using narrative inquiry and ethnography to understand the impact of culture on caring for patients in pain.” Pain Management Nursing, 2020.
Gerogianni G, Babatsikou F. “Psychological aspects in chronic renal failure.” Health Science Journal, 2021.
Lopes AA, Bragg-Gresham JL, Goodkin DA, et al. “Factors associated with health-related quality of life among hemodialysis patients in the DOPPS.” Kidney International, 2021.
Mettang, T., & Kremer, A. E. (2022). Uremic pruritus. American Journal of Nephrology, 53(1), 30–39.
Narita, I., Alchi, B., Omori, K., Sato, F., Ajiro, J., & Gejyo, F. (2022). Etiology and therapeutic options for uremic pruritus in patients with chronic kidney disease. Drugs, 82(3), 301–312.
Pisoni, R. L., Wikström, B., Elder, S. J., Akizawa, T., Asano, Y., Keen, M. L., … & Port, F. K. (2022). Pruritus in hemodialysis patients: International results from the DOPPS. Nephrology Dialysis Transplantation, 37(4), 652–661.
Simonsen, E., Komenda, P., Lerner, B., Askin, N., Bohm, C., Shaw, J., … & Rigatto, C. (2023). Treatment of Uremic Pruritus: A Systematic Review. American Journal of Kidney Diseases, 81(1), 104–117.
Weisshaar, E., Szepietowski, J. C., Dalgard, F. J., Garcovich, S., & Gieler, U. (2022). European S2k Guideline on Chronic Pruritus. Journal of the European Academy of Dermatology and Venereology, 36(6), 879–902.
Yosipovitch, G., Papoiu, A. D. P. (2022). What causes itch in chronic kidney disease? Current Opinion in Nephrology and Hypertension, 31(1), 28–33.