Introdução
Você já ouviu falar em quelantes de fósforo? Se você é da área da saúde ou está pensando em atuar com pacientes renais, especialmente aqueles que fazem hemodiálise, esse é um assunto que precisa fazer parte do seu dia a dia. Na Doença Renal Crônica (DRC), principalmente nos estágios mais avançados, os rins perdem a capacidade de filtrar e eliminar adequadamente o excesso de fósforo que consumimos através da alimentação. Esse acúmulo de fósforo no organismo pode trazer sérias consequências para a saúde dos pacientes, como coceira intensa e persistente, dores e fraqueza nos ossos, calcificações perigosas nos vasos sanguíneos e até aumento no risco de problemas cardiovasculares — uma das principais causas de morte entre pacientes renais.
E é justamente para controlar esse fósforo em excesso que entram os quelantes de fósforo. Esses medicamentos atuam como aliados importantes no tratamento, impedindo que o fósforo dos alimentos seja absorvido pelo corpo. Só que não basta apenas prescrever: é fundamental que o profissional de saúde, especialmente o enfermeiro ou o técnico de enfermagem, oriente o paciente sobre o uso correto — quando tomar, como tomar e quais cuidados precisam ser seguidos para que o tratamento realmente funcione.
O que são quelantes de fósforo?
Os quelantes de fósforo são medicamentos usados por pessoas com doença renal crônica para evitar que o fósforo dos alimentos seja absorvido pelo intestino. Eles são tomados, geralmente, junto com as refeições principais, porque é nesse momento que o fósforo dos alimentos entra no sistema digestivo. O objetivo desses remédios é se ligar ao fósforo presente na comida e impedir que ele passe para o sangue. Isso ajuda a manter os níveis de fósforo mais controlados no organismo (Block et al., 2019).
Para quem tem rins saudáveis, o excesso de fósforo é eliminado naturalmente pela urina. Mas nos pacientes renais, especialmente os que fazem hemodiálise, os rins já não conseguem realizar essa função. Como resultado, o fósforo se acumula no sangue e pode causar uma série de problemas: coceira intensa na pele (conhecida como prurido urêmico), dores nos ossos, fraqueza muscular, calcificações nos vasos sanguíneos e até nos órgãos internos, além de um risco muito maior de doenças do coração. Esse desequilíbrio também pode levar ao hiperparatireoidismo secundário, uma alteração hormonal que afeta o metabolismo do cálcio e do fósforo, agravando ainda mais o quadro clínico (Block et al., 2019).
É por isso que controlar o fósforo é tão importante — e os quelantes de fósforo são peças-chave nesse controle. Porém, o uso incorreto ou irregular desses medicamentos pode comprometer sua eficácia. Por isso, é essencial que o profissional de saúde oriente o paciente sobre a forma correta de uso, a importância da adesão ao tratamento e os cuidados com a alimentação. Além disso, estudos recentes mostram que o controle adequado do fósforo está associado a menores taxas de mortalidade e melhor qualidade de vida em pacientes em diálise. Um bom acompanhamento nutricional e medicamentoso pode fazer toda a diferença (Souza et al., 2023).
Tipos de quelantes de fósforo e como atuam
Quando falamos em controlar o fósforo no sangue de pacientes com doença renal crônica, especialmente os que estão em hemodiálise, é fundamental entender que existem diferentes tipos de quelantes. Cada tipo tem suas características, indicações específicas e possíveis efeitos colaterais. O conhecimento sobre essas diferenças ajuda os profissionais de saúde, principalmente a equipe de enfermagem, a orientar melhor o paciente e garantir um tratamento mais eficaz e seguro (Jamal et al., 2022).
De forma geral, os quelantes de fósforo são divididos em dois grupos principais: os que contêm cálcio e os que não contêm. A escolha do tipo mais adequado vai depender dos exames laboratoriais, da presença ou não de calcificações vasculares, do nível de cálcio no sangue e de outros fatores clínicos que o médico avalia. Por isso, é sempre uma decisão individualizada, feita com base em cada caso (Jamal et al., 2022).
- Quelantes com cálcio: Esse grupo inclui medicamentos como o carbonato de cálcio e o acetato de cálcio, que são amplamente utilizados devido ao seu custo mais acessível e boa eficácia. Eles atuam se ligando ao fósforo presente nos alimentos, formando compostos insolúveis que são eliminados pelas fezes. Um benefício adicional é que esses medicamentos também fornecem cálcio ao organismo — o que pode ser útil em pacientes que apresentam baixos níveis de cálcio no sangue (Pereira et al., 2020).Por outro lado, o uso excessivo ou inadequado desses quelantes pode aumentar demais o cálcio no organismo, favorecendo calcificações nos vasos sanguíneos e órgãos, o que eleva o risco cardiovascular. Por isso, é necessário fazer um acompanhamento cuidadoso, com monitoramento frequente dos níveis de cálcio e fósforo (Lopes et al., 2023);
- Quelantes sem cálcio: Nesse grupo estão o sevelâmer (disponível nas formas cloridrato e carbonato) e o carbonato de lantânio. Esses medicamentos não fornecem cálcio e, por isso, são mais indicados quando o paciente já apresenta níveis elevados de cálcio ou quando há risco de calcificações vasculares. O sevelâmer, por exemplo, também tem um efeito adicional benéfico: ele pode ajudar a reduzir o colesterol LDL (o “colesterol ruim”), o que é uma vantagem para pacientes com risco cardiovascular elevado (Pereira et al., 2020).Embora esses medicamentos sejam mais caros, eles têm mostrado bons resultados em estudos clínicos e são considerados seguros e eficazes no controle da hiperfosfatemia (níveis elevados de fósforo no sangue) em pacientes renais crônicos (Lopes et al., 2023).
Como orientar o paciente para usar corretamente
Aqui entra o papel essencial da enfermagem. Não basta apenas entregar o medicamento: o sucesso do tratamento depende diretamente da forma como o paciente utiliza o remédio no dia a dia. Por isso, a orientação precisa ser clara, didática e empática (Cozzolino et al., 2021). Abaixo estão pontos-chave para orientar o paciente de forma eficaz:
- Tomar sempre junto com as refeições: O quelante só funciona se estiver no intestino ao mesmo tempo em que o alimento está sendo digerido. Se for tomado antes ou depois, perde sua eficácia (Daugirdas et al., 2022);
- Respeitar a dose prescrita: Alguns pacientes acham que podem pular a dose se comerem pouco, mas isso não é verdade. O medicamento foi ajustado à dieta e às necessidades do paciente. Pular doses com frequência leva à perda de controle do fósforo (Daugirdas et al., 2022);
- Observar e relatar efeitos colaterais: Alguns efeitos comuns incluem prisão de ventre (especialmente nos quelantes com cálcio) e desconforto abdominal ou náuseas (mais comuns com sevelâmer). Oriente o paciente a relatar qualquer sintoma ao médico — e nunca interromper o uso por conta própria (Daugirdas et al., 2022);
- Educar com empatia e linguagem acessível: Use metáforas simples e que façam sentido no cotidiano do paciente: “Imagina que esse remédio é uma esponja que gruda no fósforo da comida. Se você não tomar a esponja junto com a comida, ela não vai conseguir absorver nada. Aí o fósforo vai direto para o seu sangue.”
Esse tipo de explicação aumenta a adesão ao tratamento e mostra ao paciente que ele é parte ativa no cuidado com a própria saúde.
Desafios na adesão: como a enfermagem pode ajudar
A adesão ao uso dos quelantes de fósforo ainda é um grande desafio na prática clínica. Estudos mostram que mais da metade dos pacientes em hemodiálise não seguem corretamente o esquema prescrito de quelantes. Muitos esquecem de tomar os comprimidos, não entendem a necessidade do medicamento, ou se sentem desmotivados por não sentirem sintomas quando o fósforo está elevado (Lopes et al., 2023).
Segundo Lopes et al. (2023), os principais motivos para baixa adesão incluem:
- Grande número de comprimidos por dia.
- Falta de sintomas perceptíveis (o fósforo alto não “dói”).
- Dificuldade para entender orientações complexas.
- Falta de apoio familiar.
É aí que o trabalho da enfermagem faz toda a diferença. O enfermeiro pode adotar estratégias simples e eficazes para melhorar essa adesão:
- Criar lembretes visuais, como cartões coloridos, etiquetas em potes ou alarmes no celular;
- Incluir o cuidador ou a família nas orientações, garantindo que todos compreendam a importância do uso correto;
- Avaliar frequentemente a adesão nas consultas de enfermagem, com perguntas diretas e acolhedoras;
- Trabalhar com linguagem simples, comparações práticas e reforço positivo, ajudando o paciente a se sentir parte do processo.
A escuta ativa, a empatia e o acompanhamento contínuo são pilares para transformar a rotina do paciente e garantir melhores resultados (Lopes et al., 2023).
Benefícios para a Prática Clínica
Dominar o tema “controle do fósforo” e saber como orientar corretamente sobre os quelantes traz inúmeros benefícios para a prática de enfermagem. O enfermeiro que compreende esse cuidado atua com mais autonomia e segurança, contribuindo ativamente para a prevenção de complicações (Palmer et al., 2022).
Entre os principais benefícios estão:
- Capacidade de identificar riscos de forma precoce, antes que o paciente apresente sintomas graves;
- Melhora da adesão ao tratamento, o que reduz internações, melhora exames laboratoriais e promove mais qualidade de vida;
- Redução de sintomas como coceira, fraqueza, dores ósseas e eventos cardiovasculares;
- Participação mais ativa e estratégica na equipe multidisciplinar;
- Reconhecimento profissional, tornando-se referência no cuidado de pacientes renais.
Uma boa dica é anotar sempre nas evoluções de enfermagem se o paciente tem feito uso correto dos quelantes, se apresenta dúvidas ou queixas, e se há sinais clínicos associados ao fósforo alto. Essa observação agrega valor ao cuidado, facilita o trabalho da equipe médica e demonstra o comprometimento do enfermeiro com o plano terapêutico (Palmer et al., 2022).
Conclusão
O uso correto dos quelantes de fósforo não é apenas uma rotina medicamentosa: é uma estratégia fundamental para preservar a saúde e qualidade de vida dos pacientes em hemodiálise. Quando o enfermeiro assume o papel de educador, orientador e parceiro do paciente, os resultados aparecem — tanto na adesão quanto nos exames e no bem-estar geral.
Se você quer fazer a diferença na vida de quem enfrenta a doença renal crônica, é essencial dominar esses cuidados. E isso exige formação de qualidade, com base científica e prática clínica real.
A especialização em Enfermagem em Nefrologia da NefroPós foi feita para quem deseja crescer profissionalmente e se tornar referência no cuidado renal. Com conteúdos atualizados, estágio prático e um time de professores experientes, você terá o suporte necessário para transformar sua carreira. Invista em você.
Conheça agora a pós-graduação em Enfermagem em Nefrologia da NefroPós e dê o próximo passo rumo à excelência no cuidado ao paciente renal!
Referências
Block, G. A., et al. (2019). A randomized trial of calcium acetate versus sevelamer hydrochloride in patients new to hemodialysis. Kidney International, 96(1), 84–94.
Cozzolino, M., et al. (2021). Managing phosphate binding treatment in dialysis patients. Clinical Kidney Journal, 14(Supplement_2), ii38–ii44.
Daugirdas, J. T., Blake, P. G., & Ing, T. S. (2022). Handbook of Dialysis (6th ed.). Wolters Kluwer.
Jamal, S. A., et al. (2022). Management of hyperphosphatemia in chronic kidney disease: A practical guide. Clinical Journal of the American Society of Nephrology, 17(1), 10–20.
Lopes, A. C., Santos, L. M., & Figueiredo, A. E. (2023). Adherence to phosphorus binders in hemodialysis patients. Journal of Renal Nutrition, 33(2), 101-109.
Palmer SC et al. (2022). Therapeutic strategies to improve phosphate control in chronic kidney disease: A practical guide for clinicians. Nephrology Dialysis Transplantation.
Pereira, R. A., Barreto, D. V., & Moyses, R. M. A. (2020). Hiperfosfatemia e estratégias terapêuticas em pacientes com doença renal crônica. Revista da Associação Médica Brasileira, 66(10), 1397–1403.
Souza, L. B. et al. (2023). Papel dos quelantes de fósforo na prática clínica nefrológica: revisão integrativa. Brazilian Journal of Nephrology Nursing, 5(1), 22–29.