Introdução
A hemodiálise é muito mais do que um procedimento técnico. Para quem vive com doença renal crônica em estágio avançado, ela representa uma ponte para a vida, sendo feita várias vezes por semana. E nesse cenário, o enfermeiro tem um papel fundamental. Não se trata apenas de conectar o paciente à máquina. É sobre acompanhar cada detalhe do tratamento, entender o estado clínico da pessoa, orientar, acolher e, principalmente, saber como agir com segurança. Um dos pontos que exige mais atenção da equipe de enfermagem é o uso dos medicamentos antes, durante e depois da diálise.
Você sabia, por exemplo, que alguns medicamentos precisam ser administrados em horários específicos por causa da filtração do sangue? Ou que certos remédios são retirados pelo dialisador, perdendo seu efeito? Por isso, conhecer bem os principais medicamentos usados na hemodiálise é essencial para garantir a segurança do paciente, evitar erros e melhorar o resultado do tratamento.
Por que os medicamentos são tão importantes na hemodiálise?
Durante a sessão de hemodiálise, o sangue do paciente passa por uma máquina chamada dialisador, que funciona como um “rim artificial”. Esse equipamento é responsável por remover o excesso de líquidos, toxinas e resíduos que o corpo, sozinho, não consegue mais eliminar. Mas o que muitas pessoas não sabem é que esse mesmo processo também pode alterar a quantidade de medicamentos no organismo. Alguns remédios são eliminados junto com as toxinas durante a diálise, perdendo seu efeito. Já outros, que não são facilmente filtrados, podem se acumular no corpo, o que aumenta o risco de efeitos colaterais (Brown & Wilkie, 2023).
Além disso, o próprio procedimento de hemodiálise pode gerar complicações clínicas, como:
- Queda de pressão arterial (hipotensão);
- Cãibras musculares;
- Náuseas e vômitos;
- Anemia;
- Inflamações ou infecções.
Por isso, o uso correto de medicamentos antes, durante e depois da diálise é essencial para prevenir essas situações, proteger o paciente e melhorar sua qualidade de vida. Segundo Brantley et al. (2022), o manejo inadequado da farmacoterapia em pacientes dialíticos pode aumentar em até 30% o risco de hospitalizações por complicações evitáveis. Já Franco et al. (2023), reforça que a educação da equipe de enfermagem sobre medicamentos é uma das principais estratégias para reduzir eventos adversos durante a hemodiálise.
Ou seja, o conhecimento sobre medicamentos é tão importante quanto a técnica de punção ou os cuidados com o acesso vascular. Ele permite uma atuação mais segura, mais eficiente e totalmente centrada no bem-estar do paciente (Brown & Wilkie, 2023).
Os medicamentos mais utilizados na hemodiálise
- Eritropoetina (EPO) – Combate à anemia: A anemia é uma das complicações mais comuns em pacientes renais crônicos, pois os rins doentes produzem pouca eritropoetina, hormônio que estimula a produção de glóbulos vermelhos. A solução? A administração da eritropoetina sintética, geralmente via subcutânea durante ou após a diálise.Uma dica prática é, antes de aplicar a EPO, verificar o nível de hemoglobina do paciente e se há sinais de infecção ou inflamação, que podem interferir no efeito do medicamento (Santos & Carvalho, 2022);
- Heparina – Prevenção de coagulação no circuito: A heparina é um anticoagulante usado para evitar que o sangue coagule dentro do sistema de diálise. Pode ser administrada em bolus (dose única no início) ou de forma contínua durante a sessão.É importante sempre se atentar a uma questão: avaliar sempre sinais de sangramento (gengiva, hematomas, sangramento no acesso), principalmente em pacientes idosos ou com uso de outros anticoagulantes (Santos & Carvalho, 2022);
- Quelantes de fósforo – Controle do fósforo no sangue: Pacientes em hemodiálise tendem a ter níveis elevados de fósforo, o que pode causar coceira, fraqueza óssea e risco cardiovascular. Os quelantes de fósforo ajudam a reduzir a absorção do mineral, e geralmente são tomados com as refeições.Alguns exemplos comuns são: carbonato de cálcio, sevelamer, hidróxido de alumínio (menos utilizado atualmente).Uma dica prática é prientar o paciente a tomar os quelantes junto com a comida, pois seu efeito depende da presença de fósforo no alimento (Usvyat et al., 2022);
- Anti-hipertensivos – Controle da pressão arterial: Durante e após a diálise, é comum o paciente apresentar variações na pressão arterial, principalmente queda. Alguns pacientes, porém, já chegam com a pressão alta.O papel do enfermeiro nesse caso é monitorar a pressão antes, durante e após a sessão, e ajustar a conduta com a equipe médica. Ele também deve evitar aplicar anti-hipertensivos logo antes da sessão, pois pode causar hipotensão durante a diálise (Alhawassi et al., 2023);
- Suplementos de vitamina D e cálcio – Saúde óssea: Na doença renal, há desequilíbrio no metabolismo do cálcio e da vitamina D, o que leva à fraqueza óssea e dores. Suplementos orais ou injetáveis são frequentemente usados, como o calcitriol.Uma dica prática nesse caso é ficar atento a sinais de hipercalcemia (fraqueza, náusea, confusão mental) e verificar os níveis laboratoriais com frequência (Kooman & van der Sande, 2022);
- Antibióticos – Prevenção e tratamento de infecções: Pacientes em diálise, especialmente com cateter venoso central, têm maior risco de infecções. O uso de antibióticos pode ser feito de forma profilática (preventiva) ou terapêutica.Uma situação clínica comum que pode surgir é a ocorrência de febre durante ou após a diálise pode indicar infecção no acesso. Nesse caso, o enfermeiro deve avisar imediatamente a equipe médica (Kooman & van der Sande, 2022).
Benefícios para a prática clínica do enfermeiro
Conhecer bem os medicamentos mais usados na hemodiálise é um diferencial enorme na rotina do enfermeiro, porque impacta diretamente na segurança do paciente, na qualidade do cuidado e na sua própria autonomia clínica. Quando o profissional entende quais remédios são administrados antes, durante ou após a sessão de diálise — e por que isso acontece — ele consegue agir com mais agilidade, tomar decisões com segurança e oferecer um cuidado muito mais humanizado e eficaz (Silva et al., 2022).
Um dos principais benefícios é a prevenção de eventos adversos, como reações alérgicas, hipotensão, arritmias ou sangramentos. O enfermeiro que reconhece os sinais precoces de complicações relacionadas a medicamentos, como uma queda de pressão após o uso de anti-hipertensivos ou sintomas de hipocalcemia após administração de quelantes, pode intervir rapidamente, evitando agravamentos (Silva et al., 2022).
Outro ponto essencial é a otimização do cuidado. Quando o enfermeiro sabe qual é o horário ideal para administrar determinado medicamento, entende os efeitos esperados e conhece as interações possíveis, ele consegue atuar com mais precisão e segurança. Isso é especialmente importante em medicações como eritropoetina, heparina, cálcio, ferro endovenoso e antibióticos, que exigem atenção redobrada quanto à dose, via de administração e tempo de infusão (Silva et al., 2022).
Além disso, esse conhecimento técnico ajuda o enfermeiro a orientar melhor o paciente, explicando de forma clara a função de cada medicamento, os efeitos colaterais possíveis e a importância de não interromper o uso por conta própria. Muitos pacientes não sabem, por exemplo, que um remédio pode não fazer efeito se tomado antes da diálise, e cabe ao enfermeiro esclarecer isso com empatia e clareza (Thomas & Meyers, 2023).
Outro ganho importante é a confiança na tomada de decisão. Na avaliação pré-diálise, o enfermeiro que domina a farmacologia dos pacientes consegue identificar contraindicações ou situações que exigem adaptação da conduta, como atrasar ou ajustar uma medicação. Já no pós-diálise, saber quais efeitos monitorar em função dos remédios utilizados traz mais segurança para liberar o paciente (Thomas & Meyers, 2023).
Conclusão
Entender os medicamentos mais usados na hemodiálise é essencial para oferecer um cuidado seguro, eficaz e humanizado ao paciente renal. O enfermeiro que domina esse conhecimento está mais preparado para atuar em clínicas, hospitais e centros especializados, além de contribuir para a prevenção de complicações e a melhoria da qualidade de vida do paciente.
E o melhor caminho para isso é investir em educação continuada.
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Referências
Alhawassi, T. M. et al. (2023). Managing intradialytic hypotension: strategies for frontline staff. Int J Nephrol Renovasc Dis., 16, 45–53.
Brantley SJ, Hwang KO, Elliott R. (2022). Medication management in dialysis patients: the role of the nurse. Journal of Renal Care.; 48 (1): 12–18.
Brown EA, & Wilkie M. (2023). Reducing adverse drug events in dialysis patients through education and monitoring. Clinical Kidney Journal.; 16 (5): 655–662.
Franco M, Bernardes G, Silva LO. (2023). Impacto do uso de medicamentos na prática da hemodiálise: revisão integrativa. Revista de Enfermagem Atual In Derme.; 97 (42): e0232023.
Kooman, J.P., van der Sande, F.M. (2022). Medication management in dialysis patients: new insights and challenges. Hemodialysis International, 26(2), 174–182.
Santos, R. M., & Carvalho, M. E. (2022). Impact of nursing interventions on medication adherence in hemodialysis patients: a systematic review. BMC Nephrology, 23(1), 155.
Silva, A. C., Oliveira, D. F., & Freitas, G. A. (2022). Conhecimentos dos profissionais de enfermagem sobre medicamentos utilizados na hemodiálise. Revista de Enfermagem Atual In Derme, 96(39), e0222022.
Thomas, L., & Meyers, C. (2023). Medication safety in dialysis: The nursing perspective. Journal of Nephrology Nursing, 50(2), 103–111.
Usvyat, L.A. et al. (2022). Intradialytic hypotension in hemodialysis patients: A review of definitions, pathophysiology, and management. Blood Purification, 51(5), 343–351.