Introdução
Durante a sessão de hemodiálise, o enfermeiro nem sempre sabe o que esperar — e justamente essa imprevisibilidade pode tornar seu trabalho desafiador. Frequentemente, surge uma situação urgente: o paciente, que parecia estável minutos antes, começa a apresentar confusão mental repentina ou até perda de consciência. É nesse momento que o enfermeiro demonstra sua importância.
Esses episódios não são apenas incômodos. Eles podem indicar problemas graves como hipotensão, desequilíbrios metabólicos ou outras complicações que colocam em risco a vida do paciente. Por isso, é essencial que o profissional de enfermagem esteja alerta, reconheça rapidamente os sinais e atue com decisão.
E por que isso é tão importante? Porque, além de salvar vidas, esse tipo de cuidado mostra a necessidade de preparo técnico, que só vem com dedicação e estudo. Quanto mais o enfermeiro estiver especializado, melhor será sua capacidade de entender o que está acontecendo, reagir com segurança e tranquilizar o paciente. A educação continuada em Nefrologia não é apenas um diferencial na carreira: é uma necessidade para quem quer atuar com segurança e excelência.
O que são Alterações de Consciência durante a Hemodiálise?
Alterações de consciência envolvem qualquer mudança no nível de alerta do paciente — seja ele menos consciente, mais desorientado ou completamente inconsciente. Durante a hemodiálise, isso deve ser sempre visto como um sinal de alarme, e não apenas um sintoma a ser ignorado (Jalalzadeh et al., 2024).
De acordo com um estudo publicado no American Journal of Kidney Diseases, situações graves como perda súbita de consciência podem ocorrer de forma repentina e demandar intervenção imediata. É importante que o enfermeiro esteja atento a sinais como confusão repentina, sonolência profunda, dificuldade de fala, olhar fixo ou, em casos extremos, desmaios. Essas manifestações podem causar medo ou angústia no paciente — e é nessa hora que o preparo técnico e a postura acolhedora do enfermeiro se tornam fundamentais (Jalalzadeh et al., 2024).
Ao invés de entrar em pânico, é preciso manter a calma, observar, agir com segurança e entender que essa reação pode ser o primeiro sinal de um problema que precisa ser investigado — como queda de pressão, hipoglicemia, desequilíbrio de eletrólitos, uremia ou até mesmo complicações neurológicas — e, se necessário, encaminhar o paciente para avaliação médica ou tratamento imediato (Scaini et al., 2010).
Principais Causas de Confusão Mental ou Perda de Consciência na HD
Antes de focar nas causas, é importante frisar que compreender por que essas alterações acontecem ajuda o enfermeiro a agir com mais rapidez e eficácia. Um dos problemas mais comuns é a hipotensão arterial intradialítica — queda da pressão arterial durante a sessão de diálise — que ocorre em até 25% das sessões e está relacionada à retirada rápida de volume e desequilíbrios agudos. Quando isso ocorre, o cérebro recebe menos oxigênio, o que pode desencadear confusão, fraqueza ou até desmaios (Wolfgram, 2019).
Outro fator importante é o desequilíbrio eletrolítico, especialmente de sódio e potássio. Em sessões mais intensas ou com alta taxa de filtração, esses íons podem ser eliminados de forma brusca, causando alterações no sistema nervoso central. A hipoglicemia também é uma causa frequente, sobretudo em pacientes diabéticos que usam insulina ou outras medicações para controlar a glicemia. A queda excessiva da glicose no sangue prejudica o funcionamento cerebral de imediato (Wolfgram, 2019).
A uremia, que é o acúmulo de toxinas no sangue por falha na filtração renal, pode levar à encefalopatia urêmica — uma condição marcada por confusão mental, alterações no comportamento e, em casos graves, convulsões ou coma. Por fim, apesar de mais raros, eventos como acidente vascular cerebral (AVC), convulsões ou edema cerebral podem acontecer. Embora não sejam tão frequentes, são potencialmente fatais e exigem diagnóstico e tratamento rápidos (Mistry, 2019).
Como o Enfermeiro Deve Agir?
Antes de qualquer ação, é importante entender que os momentos de confusão ou inconsciência durante a hemodiálise exigem uma atuação rápida e organizada. A seguir, confira como conduzir esse atendimento de forma contínua e eficiente (Murray, 2006).
O primeiro passo é avaliar o paciente com precisão e rapidez. Realize a checagem dos sinais vitais imediatamente — pressão arterial, frequência cardíaca, saturação de oxigênio e temperatura — pois essas medidas ajudam a identificar a causa da alteração. Em seguida, verifique a glicemia capilar, principalmente em pacientes diabéticos, já que a hipoglicemia pode causar confusão mental instantaneamente. Se possível, converse com o paciente, ainda que ele esteja confuso; isso ajuda a avaliar o nível de consciência e o tipo de alteração (Murray, 2006).
Depois dessa avaliação inicial, é hora de posicionar o paciente de forma adequada. Se houver suspeita de queda na pressão arterial, a posição de Trendelemburg (cabeça para baixo e pernas elevadas) é recomendada para melhorar a perfusão cerebral. Se o paciente estiver inconsciente, mantenha a via aérea livre — use decúbito lateral se houver risco de vômito — e garanta permeabilidade respiratória (Pereira et al., 2005).
A seguir, é fundamental interromper ou reduzir a ultrafiltração. Reduzir a retirada de líquidos ou pausar temporariamente a diálise pode estabilizar o paciente, especialmente em caso de hipotensão, conforme indicam diretrizes clínicas. Caso a glicemia esteja baixa, administre glicose venosa conforme protocolo interno. Cada unidade tem seus próprios procedimentos, mas a prontidão e a rápida intervenção são essenciais para evitar danos neurológicos (Pereira et al., 2005).
Por fim, comunique imediatamente o médico nefrologista. Mesmo que a situação se normalize após as primeiras medidas, relatar o incidente é imprescindível para investigação e prevenção de novos episódios. A consistência na comunicação fortalece a segurança do paciente e facilita o trabalho em equipe (Pereira et al., 2005).
Exemplo Clínico
Imagine a seguinte situação: uma paciente de 65 anos, diabética, começa a apresentar sonolência excessiva no meio da diálise. O enfermeiro percebe que ela está com fala arrastada e dificuldade para responder. Imediatamente, checa a glicemia capilar: 45 mg/dL. O diagnóstico é hipoglicemia. Glicose é administrada, a paciente melhora em poucos minutos.
Esse exemplo mostra como a observação atenta e a ação rápida fazem toda a diferença. E o melhor: com conhecimento e preparo, o enfermeiro se sente seguro para atuar.
Benefícios para a Prática Clínica do Enfermeiro
Sabemos que a rotina em unidades de hemodiálise pode ser intensa e cheia de situações imprevisíveis. Nesse contexto, o preparo do enfermeiro faz toda a diferença (Assimon et al., 2019).
Ter habilidades para agir com rapidez e precisão traz inúmeros benefícios. A capacidade de reconhecer sinais iniciais de alterações no estado de consciência permite tomar decisões antes que o quadro evolua, evitando complicações graves, como sequelas neurológicas ou óbito. Além disso, quando as intervenções são bem fundamentadas, há maior segurança para o paciente, o que reflete em resultados positivos no cuidado prestado (Assimon et al., 2019).
Profissionais preparados também ganham maior reconhecimento dentro da equipe multiprofissional, pois sua atuação baseada em conhecimento técnico acrescenta valor à assistência. Mas além do reconhecimento, estar capacitado garante mais autonomia e eficiência, diminuindo o tempo de resposta e aumentando a qualidade do serviço (Hora Passos et al., 2024).
Dicas Práticas para o Dia a Dia
- Observe pequenas mudanças no comportamento do paciente — muitas vezes sinais sutis antecedem o descompasso;
- Registre com clareza qualquer evento adverso no prontuário, para que seja possível acompanhar e prevenir novas situações;
- Estude e revise com frequência os protocolos da sua unidade de diálise; orientações atualizadas fazem diferença;
- Participe de treinamentos e atualizações periódicas, como simulações, estudos de caso ou cursos rápidos — eles mantêm seu conhecimento afiado.
Conclusão
Alterações de consciência durante a hemodiálise são, sem dúvida, situações críticas. Elas exigem que o enfermeiro esteja atento, preparado e capaz de agir com segurança. Identificar rapidamente os sinais, entender as possíveis causas e aplicar condutas imediatas pode literalmente salvar uma vida.
Essa capacidade não é fruto do acaso, mas sim de preparo contínuo e busca constante por conhecimento. A educação continuada em Nefrologia é essencial para o enfermeiro que deseja atuar com excelência, confiança e impacto real no bem-estar dos pacientes.
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Referências
Assimon, M.M., Wang, L., Flythe, J.E. Cumulative exposure to frequent intradialytic hypotension associates with new-onset dementia among elderly hemodialysis patients. Kidney Int Rep. 2019.
Hora Passos, R. et al. Predicting intradialytic hypotension in critically ill patients undergoing intermittent hemodialysis: a prospective observational study. Intensive Care Med Exp. 2024;12:82.
Jalalzadeh, A. et al. Prolonged Altered Mental Status in a Diabetic Hemodialysis Patient: Osmotic Demyelination Syndrome. Intern Med. 2024;63(11):1591–1596.
Mistry, K. Dialysis disequilibrium syndrome prevention and management. Int J Nephrol Renovasc Dis. 2019.
Murray, A.M. Cognitive impairment in hemodialysis patients is common. Neurology. 2006.
Pereira, A.A. et al. Cognitive function in dialysis patients. Am J Kidney Dis. 2005.
Scaini, G. et al. Mecanismos básicos da encefalopatia urêmica. Revista Brasileira de Terapia Intensiva. 2010.
Wolfgram, D.F. Intradialytic Cerebral Hypoperfusion as Mechanism for Cognitive Impairment in Patients on Hemodialysis. J Am Soc Nephrol. 2019.