Avaliação de Maturação da Fístula: Papel da Enfermagem no Pré-Diálise

Introdução

A fístula arteriovenosa, conhecida como FAV, é um tipo de acesso criado cirurgicamente no braço do paciente com doença renal crônica que vai iniciar a hemodiálise. Ela conecta uma artéria a uma veia, permitindo que o sangue circule com maior volume e velocidade, o que é essencial para que a máquina de diálise possa “filtrar” o sangue de forma eficaz. Mas não basta apenas criar a fístula. Para que ela funcione bem, ela precisa passar por um processo chamado maturação — ou seja, ela precisa se desenvolver, ganhar resistência e calibre suficiente para ser puncionada de forma segura e eficaz. E esse processo leva um tempo, que varia de paciente para paciente.

É aqui que entra o olhar atento da enfermagem. Desde os primeiros dias após a cirurgia, o enfermeiro tem um papel essencial: avaliar, acompanhar e identificar sinais de que a fístula está amadurecendo corretamente. Com uma boa avaliação e intervenções precoces, é possível evitar problemas como o uso de cateteres (que têm mais risco de infecção) e garantir mais qualidade de vida ao paciente renal. Neste artigo, você vai entender melhor o que é a maturação da FAV, porque ela é tão importante e quais são os principais cuidados que o enfermeiro deve ter nesse processo. Tudo explicado de forma prática e acessível, pensando no seu dia a dia como profissional da saúde.

O que é a Maturação da Fístula?

A maturação da fístula arteriovenosa (FAV) é o processo natural de adaptação que acontece após a criação cirúrgica da fístula. Durante esse período, que costuma durar entre 6 semanas a até 3 meses, a veia conectada à artéria começa a se adaptar à nova pressão do sangue arterial. Ela vai aumentando de calibre (diâmetro) e espessura, se tornando mais forte, visível e palpável – pronta para ser puncionada durante as sessões de hemodiálise (Al-Jaishi et al., 2014).

Mas atenção: nem toda fístula amadurece sozinha. Em alguns casos, ela pode não desenvolver adequadamente, o que exige intervenção precoce. Por isso, o acompanhamento da maturação é fundamental, especialmente nas primeiras semanas após a cirurgia (Al-Jaishi et al., 2014).

A enfermagem deve observar aspectos como:

  • Presença de frêmito e sopro (aquela vibração e som característicos da fístula funcionante);
  • Calibre e consistência da veia;
  • Distensão adequada;
  • Profundidade da fístula (idealmente superficial);
  • Facilidade de compressão e punção.

Um estudo publicado no Journal of Vascular Access (Siddiqui et al., 2022) reforça que o sucesso da FAV está diretamente ligado ao monitoramento sistemático e à identificação precoce de falhas na maturação. Outra revisão publicada na Seminars in Dialysis (Allon & Robbin, 2021) destaca que até 40% das fístulas não amadurecem espontaneamente e que a intervenção precoce pode dobrar a taxa de sucesso do acesso.

Por isso, é tão importante que enfermeiros e técnicos estejam capacitados para fazer essa avaliação desde cedo. Um acesso bem maturado evita complicações, reduz internações e melhora a eficiência da diálise.

Critérios de Avaliação da Maturação

A avaliação da maturação da fístula arteriovenosa (FAV) é um processo fundamental que deve começar logo após a cirurgia e seguir de forma contínua nas semanas seguintes. O objetivo é garantir que a fístula esteja se desenvolvendo de forma adequada para se tornar um acesso seguro e eficaz para a hemodiálise. Para isso, os profissionais de saúde utilizam alguns critérios clínicos que ajudam a identificar se a fístula está pronta para o uso. Esses critérios ficaram conhecidos como a “Regra dos 6”, por envolver três parâmetros simples que utilizam o número seis como referência (Lee et al., 2020).

O primeiro critério é o fluxo sanguíneo adequado, que deve ser de pelo menos 600 mL por minuto. Esse volume garante que a diálise possa ser realizada de maneira eficiente, com uma boa remoção das toxinas do organismo. O segundo é o diâmetro da veia, que deve medir no mínimo 6 milímetros. Esse calibre permite uma punção mais fácil e segura com as agulhas de diálise. O terceiro ponto é a profundidade da veia, que deve estar a menos de 6 mm da superfície da pele, o que facilita o acesso e reduz o risco de complicações na punção (Lee et al., 2020).

Além da avaliação clínica feita com inspeção, palpação e ausculta, alguns casos podem exigir exames complementares, como o ultrassom doppler, para verificar o fluxo e a estrutura da veia. Estudos recentes mostram que a aplicação sistemática desses critérios aumenta as chances de sucesso da FAV. A avaliação precoce e estruturada da maturação da fístula pode reduzir em até 50% o uso prolongado de cateteres venosos centrais — o que diminui os riscos de infecções graves e hospitalizações (Sidawy et al., 2020).

Esses parâmetros, apesar de simples, têm um impacto enorme na qualidade da terapia dialítica e na segurança do paciente. Por isso, é essencial que os profissionais da saúde, especialmente da enfermagem, estejam atentos a cada um desses sinais e saibam quando intervir ou encaminhar para avaliação médica (Sidawy et al., 2020).

Papel da Enfermagem na Avaliação da Maturação

O papel da enfermagem na avaliação da maturação da fístula arteriovenosa é essencial para garantir um acesso seguro e funcional ao paciente renal. Desde o momento em que a fístula é criada, os profissionais de enfermagem se tornam os principais responsáveis pelo acompanhamento diário da evolução desse acesso. A observação clínica cuidadosa, realizada com métodos simples como inspeção, palpação e ausculta, faz toda a diferença na detecção precoce de complicações ou de falhas na maturação (Gibson et al., 2022).

Durante a inspeção visual, o enfermeiro deve observar o local da fístula à procura de sinais de infecção, hematomas, inchaço, vermelhidão ou outras alterações na pele. Já na palpação, é importante sentir a presença de um thrill, que é uma vibração contínua e suave, perceptível ao toque, indicando que o sangue está passando com força e fluidez pelo novo trajeto. Esse sinal é considerado um bom indicador do fluxo adequado. Na ausculta, feita com o estetoscópio, deve-se ouvir um sopro contínuo, que também sinaliza fluxo sanguíneo funcional — quanto mais grave e audível o som, melhor tende a ser o desempenho da fístula (Gibson et al., 2022).

Além desses cuidados técnicos, a enfermagem também tem um papel fundamental na educação do paciente. Explicar de forma clara e simples os cuidados diários com a FAV — como evitar carregar peso com o braço da fístula, não dormir sobre o local, manter a higiene e relatar imediatamente qualquer mudança — pode prevenir complicações e prolongar a vida útil do acesso. Pacientes que recebem orientações adequadas da equipe de enfermagem apresentam até 40% menos complicações vasculares durante a terapia dialítica (Dember et al., 2014).

Dessa forma, a enfermagem se coloca como um elo indispensável entre o paciente, a equipe médica e a qualidade do tratamento. Com conhecimento técnico, sensibilidade e presença constante, o enfermeiro é peça-chave para o sucesso da maturação da FAV e para a segurança do paciente renal (Dember et al., 2014).

Importância da Educação Continuada

A avaliação correta da maturação da fístula arteriovenosa (FAV) exige mais do que apenas prática: ela depende de conhecimento técnico atualizado e de uma compreensão profunda das mudanças nas diretrizes clínicas. A educação continuada é uma ferramenta essencial para que os profissionais de enfermagem estejam sempre prontos para oferecer um cuidado seguro, preciso e humanizado aos pacientes em terapia renal substitutiva (Tatum et al., 2022).

Na prática clínica, pequenas decisões — como reconhecer um thrill ausente ou interpretar corretamente um sopro anormal — podem fazer uma grande diferença no desfecho do tratamento. Quando o enfermeiro tem acesso à formação continuada em nefrologia, ele ganha não só mais confiança, mas também competência para tomar decisões baseadas em evidências, prevenir complicações e atuar com maior autonomia ao lado da equipe multiprofissional (Tatum et al., 2022).

Estudos recentes reforçam esse impacto. Programas de educação continuada focados em cuidados com acesso vascular foram associados a uma melhora significativa na taxa de detecção precoce de falhas na maturação da FAV e uma redução no uso de cateteres por tempo prolongado. Enfermeiros especializados têm até 3 vezes mais chances de identificar precocemente sinais de estenose ou trombose, fatores críticos para a viabilidade da fístula (García-García et al., 2021).

Investir em atualização profissional não é apenas uma exigência do mercado de trabalho — é um ato de compromisso com o paciente e com a própria carreira. A especialização em nefrologia fortalece as bases teóricas e práticas do cuidado, permitindo que o enfermeiro atue com mais segurança, respeito à individualidade do paciente e alinhamento com os protocolos mais atuais (García-García et al., 2021).

Conclusão

A maturação adequada da fístula arteriovenosa é um dos pilares para o sucesso da hemodiálise. Quando esse processo é bem conduzido, ele garante um acesso vascular eficiente, duradouro e com menos riscos para o paciente. Dentro desse contexto, a enfermagem se destaca como protagonista — desde a avaliação clínica e técnica da fístula até o acompanhamento contínuo e a orientação educativa ao paciente renal.

Mas para exercer esse papel com excelência, é indispensável que o profissional esteja bem preparado. A atualização constante, aliada a uma formação sólida, faz toda a diferença na prática clínica. E é exatamente por isso que a especialização em nefrologia se tornou uma escolha estratégica para quem deseja se destacar no cuidado ao paciente em diálise.

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Referências

Al-Jaishi AA, et al. “Patency rates of the arteriovenous fistula for hemodialysis: a systematic review and meta-analysis.” Kidney International. 2014; 85(4): 901–907.

Allon M, Robbin ML. “Hemodialysis vascular access monitoring: current concepts.” Seminars in Dialysis. 2021; 34(3): 232–239.

Dember LM, Beck GJ, Allon M, et al. Effect of Early Fistula Maturation Evaluation on Catheter Use in Hemodialysis: A Randomized Clinical Trial. JAMA. 2014;312(18):2044–2053.

García-García G, Harden PN, Chapman J. Education and training in nephrology: key strategies for improving care. Kidney Int Suppl. 2021;11(3):e41–e45.

Gibson K, Leake A, Fick-Bailey K, et al. Nursing Assessment of Hemodialysis Access: Bridging Education and Practice. J Renal Care. 2022;48(1):23–30.

Lee T, Mokrzycki M, Moist L, et al. Standardized Definitions for Hemodialysis Vascular Access: 2019 Update by the Vascular Access Work Group. Kidney Int. 2020;97(6):1116–1120.

Sidawy AN, Spergel LM, Besarab A, et al. The Vascular Access Guidelines of the National Kidney Foundation 2019 Update. J Vasc Surg. 2020;72(3):1S–66S.

Siddiqui MA, et al. “Primary and secondary patency rates in AVFs: analysis of outcomes.” Journal of Vascular Access. 2022; 23(1): 33–40.

Tatum C, Mayo L, Fortney CA. The Importance of Ongoing Education for Nurses in Nephrology. Nephrology Nursing Journal. 2022;49(1):33–40.

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